Turismo: Indústria ou fenômeno?
O dicionário Aulete define a palavra "fenômeno" como:
1. Fato, acontecimento ou processo que pode ser observado na natureza ou na sociedade;
E a palavra "indústria" como:
1. Atividade, trabalho mecânico ou mercantil.
2. Empresa de produção ou fabricação de bens materiais;
3. O conjunto das fábricas de determinado setor; o complexo industrial;
4. Econ. A produção de bens de consumo (alimentos, carros etc.) e bens de produção (máquinas industriais, ferramentas etc.) em fábricas;
5. Pej. Exploração lucrativa e inescrupulosa de uma atividade;
Já nas primeiras histórias contadas pelo ser humano, o Homem* tem a necessidade de se deslocar e movimentar-se de um lugar a outro, sempre procurando lugares para acomodar-se. E esses são os históricos de viagem dos humanos, que futuramente veio a se transformar em turismo.
Desde os seus primórdios, o turismo é estudado através de variados olhares, e um desses primeiros olhares foi o administrativo.
Mesmo tendo raízes profundas na história da humanidade, o turismo só ganhou espaço de verdade após a Revolução Industrial, com a popularização do capitalismo e do lazer.
Como o estudo – de um modo realmente aprofundado - do turismo se desenvolveu também no período pós Revolução Industrial, os profissionais da área, e de administração, foram muito influenciados pelo olhar capitalista e definiam turismo como indústria. O definiam assim, pois é um setor que gera grande movimento de capital, envolve empresas e trabalhadores, é uma produção de bens de consumo e, também, o consideravam um complexo industrial.
E até hoje, apesar de a grande maioria dos profissionais da área concordarem com a definição de fenômeno ao turismo, muitos o veem como indústria. E esses muitos a quem me refiro, em sua esmagadora maioria, são profissionais da área de administração. Um exemplo é o próprio presidente da EMBRATUR (Instituto Brasileiro de Turismo, antiga Empresa Brasileira de Turismo), Vinicius Lummertz, que logo ao assumir a presidência do instituto, em 2015, declarou que "é preciso olhar para o turismo como uma indústria".
Essa definição de turismo tardou um pouco para ser refutada, pois os antropólogos - que são quem definiram o turismo como fenômeno - demoraram-se a estudar a atividade turística. Pois, na época, a mercantilização do turismo não levava em consideração os anfitriões do turismo, que são as comunidades, que, por sua vez, são os objetos de estudo da antropologia. Por isso essa, quase, recusa dos antropólogos em estudar o turismo.
Porém, quando desenvolveram o interesse no assunto, os antropólogos refutaram essa visão industrial do turismo e o definiram como um fenômeno.
Nash (1981, p.461) defendia que "o turismo é um assunto legítimo para a investigação antropológica", porque a definição de turismo como fenômeno provém do argumento de que a atividade turística é um ato de interação humana, de contato e partilha de culturas. Macleod e Selwyn (2002, p.27) definem turismo como:
"(...) Um fenômeno que inicia e provoca uma gama extremamente diversificada de experiências humanas e produz profundas transformações socioculturais".
Miguel Acerenza (1999) explica que entende a visão industrial ao turismo, mas não concorda com ela, pois não é na economia que está a raiz dessa atividade, e sim, no Homem, que é o elemento fundamental do turismo.
Sérgio Molina, já acredita que a visão econômica do turismo é insuficiente para defini-lo como um todo:
"A relevância contemporânea do fenômeno turístico não pode ser explicada a partir do pressuposto econômico. Isso implica decompor o objeto reduzindo-o a um dos seus elementos simples (...). O modelo indústria turística (...) não é o turismo: é uma elaboração conceitual econômica tangível, cuja essência está delineada por uma cosmovisão materialista, mecanicista e reducionista da experiência humana." (Molina 1991, p.106)
Concluímos, então, que o turismo - que em sua essência é a interação humana e de culturas - não pode ser vista apenas pelo lado econômico, pois isso o diminui como ciência e como atividade.
Deixo claro aqui que esse texto é um pequeno resumo de uma longa discussão repercutida há anos e completamente influenciado pela minha visão de turismo - baseada em livros, artigos e estudos na área - e não pode ser levado como verdade absoluta.
* O uso da palavra "Homem", com "h" maiúsculo, neste texto tem como objetivo o significado de humanidade ou seres humanos.
Fontes:
BARRETO, Margarita. Manual de iniciação ao estudo do turismo: 17.ed. São Paulo: Papirus, 2003.
https://dspace.uevora.pt/rdpc/bitstream/10174/16726/1/No%C3%A9mi%202015%20-%20Antropologia%20e%20Turismo.pdf - acessado em 30/04/18
https://www.revistas.usp.br/rta/article/viewFile/63684/66447 - acessado em 30/04/18